Recentemente, o CiCarne publicou o relatório “O futuro da cadeia produtiva da carne bovina brasileira: uma visão para 2040”(1), que visa subsidiar a definição de agendas estratégicas para formulação de políticas públicas e privadas, bem como a agenda programática de pesquisa com base nos resultados do monitoramento do ambiente externo, a partir de sinais e tendências que impactarão nesta cadeia produtiva. O boletim CiCarne desta semana traz um resumo da análise deste documento no tema “Indústria frigorífica”.
- Menor ociosidade de frigoríficos
A ociosidade de plantas frigoríficas no Brasil leva ao aumento do preço pago pelo consumidor final. A eliminação do abate clandestino diminuiria esta ociosidade, mas isto demandaria mais recursos públicos para serviços de inspeção. Cooperativas de produtores de bovinos poderiam amenizar este problema. Outra solução que é tendência seria a verticalização, isto é, frigoríficos com rebanho próprio. É provável que, até 2040, a produtividade dos frigoríficos esteja muito superior à atual e com níveis de ociosidade mínimos, graças a ambas as soluções.
- Produtos com menos aditivos
Aditivos são usados em produtos cárneos para aumentar a vida de prateleira (shelf life) no varejista, realçar sabores e outros usos, mas percebe-se aumento na oferta de produtos com menos aditivos pela crença, cada vez maior, do consumidor de que aditivos possam causar danos à saúde. Há fortes indicativos de que até 2040 tecnologias de processamento reduzirão o uso de aditivos a níveis mínimos.
- Tecnologia em embalagens
A inovação em embalagens contribui para a redução no uso de aditivos. A utilização de vácuo ou atmosfera modificada são tecnologias disponíveis. A automação do porcionamento e da embalagem no frigorífico facilita o uso destas tecnologias. Com o aumento das exportações a países em que o consumidor é mais exigente, será necessário investir em tecnologia de embalagens. É altamente provável que em 2040 o uso de embalagens dos produtos cárneos seja uma realidade.
- Robôs substituem humanos nas plantas frigoríficas em funções de maior risco
Em países com maior adoção de tecnologia, para cada 10 mil trabalhadores existem de 300 a 830 robôs trabalhando em funções operacionais. Enquanto, no Brasil, há apenas 1 robô para cada 10 mil trabalhadores. A automação reduz custo de mão de obra e falhas humanas. Uma das 7 causas mais importantes para a automação de plantas industriais é a melhoria na segurança do trabalho. Existe forte tendência de que grande parte da mão de obra nos frigoríficos brasileiros seja substituída por robôs até 2040, exceto em atividades de inspeção, de preparação de carcaças bovinas para resfriamento, na separação de cortes e no acondicionamento das carnes em embalagens individuais, que ainda dependerão de mão de obra humana.
- Queda da barreira sanitária das carnes brasileiras
Incidentes de contaminação da carne para exportação abalaram a confiança nos produtos cárneos brasileiros, aumentando entraves comerciais e ativismo contra o consumo da carne do Brasil. A possível diminuição do controle público sobre os frigoríficos também atraiu a atenção às questões sanitárias. No entanto, existe maior estímulo de instituições públicas aos produtores para regularizarem os cuidados sanitários dentro da porteira e no abate. Novos acordos foram firmados para exportação de carne para a Ásia e Europa, com previsão de Estados Unidos também, o que demonstra aumento na confiança dos produtos cárneos brasileiros. Por isso, acredita-se que até 2040 as dúvidas sobre a segurança sanitária da carne brasileira estejam sanadas, mas esforços devem ser feitos para evolução nesse sentido.
- A padronização do bem-estar nas plantas frigoríficas brasileiras
No Brasil, o abate humanizado de bovinos só é obrigatório em frigoríficos com certificação de inspeção federal (SIF), mas um projeto de lei quer torná-lo obrigatório também para os frigoríficos com inspeção estadual e municipal. O bem-estar e as boas práticas no abate e pré-abate são importantes pelo cuidado com os animais e para garantir eficiência produtiva. Os frigoríficos têm implantado sistemas de insensibilização e plantas anti-estresse em suas unidades de abate, visando atender aos requisitos de países exigentes quanto ao bem-estar animal, e também têm atuado como regulador privado, condicionando acordos comerciais a práticas de bem-estar pré-abate e têm atuado no treinamento e conscientização do produtor. As mudanças nos hábitos de consumo da população brasileira contribuem para esta mudança. Espera-se que até 2040 todos os frigoríficos brasileiros terão adotado boas práticas para o bem-estar animal que estarão regulamentadas para toda a cadeia produtiva da carne bovina.
- Conforto no transporte de bovinos de corte
O cuidado com os animais no transporte tem aumentado por causa das exigências de bem-estar e pela desqualificação de carcaças com contusões frequentes. Instituições privadas de abate estão monitorando os animais em tempo real com câmeras e há uma maior preocupação com a qualidade das estradas em que o caminhão de carga irá passar, evitando acidentes e contusões nos animais. É necessário que haja maiores investimentos do poder público em infraestrutura no trajeto de bovinos e por parte dos frigoríficos na aquisição de melhores meios de transporte para esse tipo de carga. É fortemente provável que as boas práticas no transporte de animais estejam regulamentadas para toda a cadeia produtiva da carne bovina até 2040.
- Certificação pública perde espaço para certificações privadas
A melhoria na imagem da pecuária brasileira depende das certificações, sejam elas via SISBOV ou via instituições privadas. A certificação no Brasil tem ganhado importância, com mais e maiores exigências, principalmente para o mercado de exportação, o que fez com que muitas empresas parassem de atuar nesse mercado. O sistema federal de rastreabilidade, o SISBOV, está presente em 1.600 fazendas brasileiras, rastreando 4 milhões de animais, e é operado por apenas 23 empresas certificadoras, mas o sistema existe há muitos anos e continua com baixa adesão. Instituições privadas têm criado seus próprios sistemas de certificação com vantagens para o produtor. Contudo, as exigências crescentes por certificação podem favorecer a adesão ao SISBOV, se houver investimento público.
- Blockchain veio para ficar
O consumidor quer saber cada vez mais sobre a origem e as características da carne que consome, induzindo o aumento da certificação de diferentes tipos de carne para diferentes nichos de mercado. Várias tecnologias têm sido introduzidas na comercialização de produtos, alavancadas por exigências dos canais de distribuição de acompanhamento do percurso do produto de sua produção até a gôndola. A Blockchain é uma das tecnologias demandadas por atacarejos e indústrias para garantir a segurança de informações de seus produtos e algumas empresas já exigem de seus fornecedores o uso desta tecnologia. Para a cadeia da carne bovina é provável que até 2040 a Blockchain seja a tecnologia mais utilizada para rastreabilidade de produtos cárneos.
Fonte: Embrapa